Pus um título aqui ou não

Nada
É alguma coisa
Mas ainda não é coisa

Tudo
Muitas coisas
Mas não uma coisa
Por ser tanto
É um nada coisa.

Coisa
Pode ser tudo
Não pode ser nada
Nada não é coisa
Na ciência do nada
Se nasce a coisa.

O sagrado profano

Que se propague em mim o melhor
Do que aprendi.
Que minhas palavras cavem caminhos
Na mente alheia.
Que vá procurar perguntas
Duvida das respostas.
Que compartilhe
E não aceite o dado.
Que desista de desistir
Entenda o caótico.

O abraço

É forte
Ou cordial


Não tem telas
Nem paredes

Envolve
Mas não amarra
Mas prende


Não se explica
Nem se completa
Sem alguém


O presente faz
O futuro desfaz
O passado refaz

31

Últimas horas para avançar
Um tempo prestes a terminar
Contagem regressiva da vida.

Angústia do término
Ansiedade de chegar
A inconstância da vontade.

Volta ao mesmo
À espera do novo
Fico pensando em palavras
Mas elas não querer me dizer nada
Penso na vida e elas voltam correndo para mim

Mas passam
E não sei mais o que a vida era
Quando falaram da vida para mim.

Nota acidental

Olhando para meu pé inchado
Inflado como balão de aniversário
Enfaixado como um recém-nascido

Me lembro do acanhado sentimento
De animal ferido
Ofegante desesperado
Segue acalmado
Pelo bando cercado

Quando tudo bem acaba
Memória de graça
Faz graça da desgraça

Ideias

Palavras contam histórias
Verdades da memória
Prima dos fatos

Ornamentam o passado
Atravessam o presente
Rascunham o futuro

Velam o pensamento
Significam no momento
Seguem caminhos vastos

Largos
Estreitos
Diferentes
Certos
Odiados
Calados

Sonho Irreal

Venha!
Viver um vulto de emoções
Criações incríveis
Que todos creem.

Num aquário
Que muda de cor
Com castelinho
Para abrigar
Com comida a flutuar.

Tudo que precisa
Aqui está
Saída não há
Porque fazem pensar
Que se afogará
Respirando ar.

Cicatriz

Um corte inesperado
Uma ferida que se abre
Uma dor que se sente.

O corpo cura
O tempo ajuda
A marca fica.

O olho espia
A mente acorda
A mancha viva
A ferida morta.

Novidades

Certo dia uma jovem senhora se senta ao meu lado. Poderia passar-se desapercebida a mim, porém nos tornamos velhas conhecidas que nunca se viram e não mais se virão. Ela me conta todas as novidades de uma longa jornada em que supera o desgaste físico, mas deixou a alma intacta. Bela educação enclausurada teve. Se transformou em prendada, muitas antes e depois dela estavam prontas, perfeitamente domesticadas para trabalhar no lar. Bem arranjadas com militares, políticos, empresários. Príncipes do mundo moderno tirando-as do calabouço para o alto do castelo. Fui uma paciente ouvinte inquieta tentando imaginar tal situação com insucesso. Contudo, o que mais insistia em rondar a minha mente eram os "porquês": por que contar pra mim?, por que ter acontecido de um jeito tão... "do nada"?, por que isso foi acontecer?, por que algo que aconteceu "do nada" tem que ter alguma explicação ou significado? por que tais situações soam sobrenaturais e misteriosas?.
E segue a jovem senhora solteira. Conta as últimas dos últimos anos. Não casou-se com um casado mesmo ele querendo que o fizesse, mandou-o de volta para a família e o agradeceu pelos serviços prestados durante duas décadas. Seguiu como secretária, amante, ovelha negra de sua geração, que lamenta não poder manter tanto contado com os sobrinhos. Viver sozinha não é sina, sofrimento... é sossego. Se sente satisfeita pelo que fez, não tem planos e se ao fim sua vida quiser ir, seguirá em frente. Seus familiares, que devem estar mais acostumados a enxergar sua alma que idade, prevê a ela mais vida. Entretanto, seu corpo confessa a mim com modéstia que prefere não fazer contas. Fiquei admirada, me dei conta do que poderia me afetar de alguma forma: com tantas coisas mostrando e pessoas seguindo caminhos tão parecidos, muitas vezes me ocorria uma sensação perturbadora de que tudo, por mais que desviasse no caminho, sempre voltava a ele, e se não voltasse, estaria perdido. Sempre ingênua continuo...

Tempestade

Do alto de uma montanha
Enquanto a terra firme resiste às ondas
Enquanto o vento  procura seu lugar
Enquanto o mar teima em seguir

Jogo palavras no ar
Algumas caem no mar
Outras vão ao chão