Miragem

Meus olhos transbordam
Olho o horizonte transparente
Tudo é verdade
E vivo
Quando diante de mim
Tudo é imagem que infiltra
A mente
Gira num carrossel
colorido
Cultivado
Guiado
Guardado
em mim

Rebelião

As palavras não soam como antigamente
Antes colaboravam lindamente
Agora me atrasam
Se recusam a formarem-se em fila
E muitas fogem
somem
Passam diante de mim

Exibidas

Saem de cena ligeiras
Cruéis
E sequestram as ideias

Elas são vítimas
de mais um comparsa
Na verdade, um veículo

O pensamento não é um carrossel
É o trem descarrilado que alcança o penhasco
Haverão outros partindo
Mas não posso perder a hora.

Da janela

Vasculho uns momentos atrás
Relembro uns futuros repetidos
Uma concha de retalhos
Insiste em me agasalhar
Assistindo a paisagem
Sendo levada pelo ar

No meu canto
Ao meu lado
Não me importa
Centenas de prédios correm
E portas se abrem
Momentos se espalham

Ainda está ao meu lado
Não quero saber
Nem dos que estão
Dos que saíram
Ou entraram
Vou voltar
Ao meu lugar

Ângulos

É única

São múltiplas
Todos buscam
Uns escondem

Uma carta manipulada
O truque do coelho
Que aparece na cartola
Eis que lá está
A carta e o coelho
Sempre ao final

Numa estrada
Há saídas, curvas, atalhos, retornos

Descidas, subidas, idas, voltas, acostamentos
Mortes, vidas

Asfalto, pneus

Olhando para o céu
Uns veem nuvens
Outros imagens

E todos reclamam
Quando cobrem o sol
Ainda mais quando ameaça
Cair água do céu

Ninguém quer ouvir relâmpagos
Então a chuva sonorizando o dia frio
Cria conforto pra aproveitar o que está.


Audição

A mente na ponta dos dedos.
O coração na ponta da língua.
É quando nunca dá para evitar
É quando nunca dá para mensurar
Uma palavra que não é palavra
É só um som por trás da raiva
Um desabafo falado não definido
Um caco de vidro que ousou ficar no caminho
E provocou o grito.

Ainda dá para juntar as melhores frases que há
Posso ter as melhores ideias
Mas ter uns dos piores pensamentos
Se propaga súbito
Entranha num susto
E corre pra longe
E não se espera que volte.

Palavras

Ah, que tanto tenho que pensar
Tanto contudo nem tanto que fazer
Tempo tardio do dia pra tentar
Trilhar o trajeto da mente que tal palavras tomam.

Tratam de trabalhar juntas
Traçam labirintos
Traem suas tradicionais escritas
Trazem variadas saídas.

E daí?
Me levarão até tua mente?
Tocarão teu coração?
Tratarão de acalmar-me?
E trazer-te?

O vidro

As sombras são incompreendidas
Reclamam que são escuras
Como se pudessem ser diferentes
Que não se vê em meio nelas

Caminhe com feixes de luz
Voltado aos olhos
E experimente sensação
De não conseguir abri-los

Pronto! Nem preciso pensar
É num vidro embaçado de todo dia
Que meus olhos veem
O que não está
Mas o que é
Um pouco de luz,
Um pouco de sombra
Eis sua cara estampada!

Expiração

Tô sem verso
Confesso
Essa rima
Fajuta
Mascara
A falta
A vergonha
De não ter
De não dizer
Pedinte de frases
Pedi à caneta
Que me ajudasse
Ao papel que me apoiasse
Feri meu orgulho
E rabisquei.

Diálogo da palavra com o paladar

Trabalhoso
Ter que pô-las todas
Organizadas, quietas,
Numa combinação
Quase sobrenatural de formas
Um tempero perfeito
Feito ao paladar
De quem provar

Mas o gosto é o mesmo
O saborear, não
Para uns o gosto revela
as combinações
Para outros é uma coisa só
Para todos começa amargo
Que vira qualquer coisa.

Enfrentamento

Louvada luta
À frente vê vitória
Todavia vitória ñ se vê
Se ñ se livra o véu
Poder ver a face em face
Do q ñ podiam ver 
Livrar lamentos.